Eu francamente não entendo a lógica veranil do "está-ridiculamente-quente-então-vou-à-praia-me-expor-diretamente-ao-sol", embora carioca e criada à beira do mar. Sim, a brisa fresca do mar é uma delícia, e o contraste da água gelada sobre a pele quente é divino. Mas quanto mais meu trabalho me ensina sobre biologia, neurociência e envelhecimento, mais quero distância do sol.
O cerne do problema é a nova compreensão de que muito da decrepitude crescente que constitui o processo de envelhecimento do corpo é devido ao acúmulo de danos ao DNA, aquela molécula enorme que constitui os 30 bilhões de pares de unidades do nosso genoma: o repositório de códigos que são traduzidos em proteínas que constroem todas as células.
Quanto mais tempo se vive, mais danos o DNA acumula. Minha própria pesquisa no momento envolve determinar se são esses danos acumulados pelos neurônios do cérebro que eventualmente encerram nossas carreiras individuais no planeta.
Donde meu novo amor por chapéus e pouca saudade do sol do verão brasileiro: radiação ultravioleta (UV) é sabidamente um grande destruidor de DNA.
O vermelho do "queimadinho de sol" no rosto é a resposta inflamatória aguda das células da pele aos danos causados ao seu DNA pelo UV solar. O bronzeado? Desejada por muitos e evitada por mim, que aprendi a ficar feliz com o que meu pai denomina minha "brancura-laboratório", pele bronzeada é pele danificada. A melanina adicional até que ajuda a proteger de mais danos, mas também é evidência de que muito estrago já aconteceu.
A pesquisa do holandês Jan Hoeijmakers, na Universidade de Rotterdam, mostrou que camundongos mutantes tornados especialmente incapazes de reparar seu DNA envelhecem prematuramente, padecem de toda forma de decrepitude, e morrem cedo, cheios de danos no cérebro. Tudo vai razoavelmente bem até o fim da infância; depois disso, o fim chega rápido.
De alguma forma, criaturas novinhas são extremamente eficazes em reparar danos ao DNA. Mas quando nos tornamos adultos, mais danos ocorrem do que são reparados, com saldo negativo crescente contra nós. Torrar ao sol é acelerar os danos à pele, se não ao corpo todo.
Não sei se exposição direta à radiação UV (prefiro esse nome, que soa danoso; "raios UV" parecem coisa de herói da Marvel) também acelera o acúmulo de danos ao DNA de neurônios, mas em todo caso, prefiro distância.
Sol indireto é bom, permite ao corpo produzir vitamina D. Sol direto é para as plantas.
Texto de Suzana Herculano-Houzel, na Folha de São Paulo.
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