Uma releitura da bandeira do Brasil, estampada com um olho humano, que deixa escapar uma lágrima. A obra de autor desconhecido começou a ser difundida nas redes sociais em 2013, muitas vezes acompanhada pelo ambíguo subtítulo “luto pelo Brasil”.
Qualquer brasileiro com acesso à internet teve a sua retina levemente arranhada pelo “olho patriota”. A ilustração foi o prenúncio de uma crise estética que hoje afeta inúmeras formas de expressão artística.
No campo das artes plásticas, destacam-se instalações infláveis como o icônico pato da Fiesp, o Pixuleco e o Super Moro.
Entre as performances, a coreografia encenada em um flash mob pró-Bolsonaro em Fortaleza, no período das eleições, deixou seu legado de eterno constrangimento.
Falando em legado, o autor do funk “Proibidão do Bolsonaro”, MC Reaça, pode não estar mais entre nós, mas sua música segue perpetuando a misoginia que ele praticou em vida.
Já o setor audiovisual sentiu o impacto da atuação do deputado do PSDB Alexandre Frota, que recentemente publicou uma série de vídeos vestido de palhaço e ameaçando opositores. Não é o Coringa que o Brasil precisa, mas o Coringa que o Brasil merece agora.
Quando o assunto é design gráfico, impossível ignorar a substituição do Photoshop —um dos softwares mais utilizados para manipulação de imagens digitais— pelo Paint Brush do Windows 95 —uma ferramenta mais arcaica, perfeita para ilustrar o amadorismo e os retrocessos do atual governo.
O boom das camisas da CBF e o figurino de Zé Carioca adotado por Luciano Hang não deixam dúvidas de que a indústria da moda também foi influenciada. Vi, com meus próprios olhos, um manequim em Copacabana usando um top com estampa militar e uma bandeira do Brasil enrolada em volta da cintura como se fosse uma minissaia.
Mas nada simboliza essa crise estética com mais precisão do que o mural de projéteis do partido Aliança pelo Brasil.
Os painéis feitos com cartuchos de munição de armas de alto calibre estão em alta.
O presidente da República, Jair Bolsonaro, e o governador do estado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, já foram retratados com essa técnica, que alude à necropolítica praticada por ambos.
Um partido que escolheu o número 38, o mesmo de um revólver, não poderia ser melhor representado. Seu logo de projéteis é um ataque à democracia, à população brasileira e às nossas retinas, que nunca estiveram tão vulneráveis.
Texto de Manuela Cantuária, na Folha de São Paulo.