Sem paradoxos e contradições, nada tem gosto de Brasil. Existiam três operações Lava Jato: a dos procuradores do Ministério Público Federal, a do juiz Sérgio Moro e a dos políticos que queriam tirar o PT do poder. Essas três vertentes se encontraram em alguns momentos. O MPF atingiu o seu ponto mais alto na ânsia condenatória com o powerpoint do procurador Deltan Dallagnol. Sérgio Moro deu a sua maior cartada ao deixar vazar o grampo da conversa de Dilma com Lula, que levou ao fim do governo da petista. O MPF e Moro sempre tiveram intenções justificadas: combater furiosamente a corrupção forçando os limites da legislação e explorando as brechas legais para obter confissões. Exemplo: não existe número de dias fixo para a prisão preventiva. Quem sabia disso? Era pegar, usar e colher.
Acontece que Dallagnol e Moro acabaram usados pelos políticos que buscavam uma alavanca para desalojar o petismo do poder. Cansados de perder eleições e ansiosos pelo retorno do neoliberalismo de FHC, políticos decidiram jogar pesado atacando a corrupção do adversário da qual sempre foram cúmplices ou protagonistas. A Lava Jato foi obrigada a andar sempre mais rápido. Quanto mais se expôs, mais abriu o flanco para críticas: abuso de poder, seletividade, condenação sem provas materiais e por aí vai. Moro e Dallagnol tornaram-se alvo de advogados criminalistas, de militantes políticos e de constitucionalistas de ocasião. Eles teriam escolhido um foco para diminuir o atrito? Por que nunca um tucano graúdo caiu nas redes estreitas da chamada república de Curitiba? Ninguém responde.
Derrubado o petismo, a Lava Jato deixou de interessar aos velhos donos do poder. Mas Dallagnol e Moro continuaram a tocar a operação que conceberam. Só que passaram a lidar com profissionais da resistência oficial. O aparelhamento petista do Estado sempre foi amador, contraditório e tabajara. Michel Temer alterou o rumo das coisas. A Lava Jato agoniza no seu auge, justamente quando Sergio Moro se sente nas alturas. O STF já mudou o seu entendimento. O intrépido Moro perdeu inquéritos para outros juízes e lugares. A Lava Jato do Procurador-Geral da República esbarrou em conveniências antes ignoradas. Aécio Neves não foi para a cadeia, Rocha Loures anda livre, leve e solto, salvo pelo peso da tornozeleira, o dinheiro encurtou e o efetivo em Curitiba diminuiu. Geddel já está em casa.
Tudo se ajeita. A Lava Jato deverá entrar para a história como um sonho de verão de jovens procuradores, com certo viés missionário e certezas demais, mas não sem ótimas razões, e de um juiz inspirado em operações internacionais que terminaram mal. Ingênuos, eles acreditaram que com apoio da mídia e da população conseguiriam vencer todos os obstáculos. Achavam que estavam dando as cartas. Não percebiam que o baralho já estava de posse de gente acostumada a trapacear dando as cartas e jogando de mão. O que sobrará disso tudo? Uma presidente deposta, alguns empresários na cadeia por pouco tempo, algumas carreiras políticas justamente abaladas, muitos executivos corruptos albergados em suas mansões cumprindo penas de ficção e um sistema político desacreditado, mas disposto a não mudar e capaz de se reconstituir. Quem é mais forte? A Lava Jato ou o Brasil corrupto? Para Sérgio Moro faltava o último ato: condenar Lula. Está feito. O verão acabou. O resto é nuvem passageira.
No futuro, quando falarem do Brasil do começo do século XXI, os historiadores colocarão uma nota de rodapé nos seus textos para explicar o papel de Sérgio Moro na derrocada do lulopetismo e na recomposição do capitalismo nacional de compadrio. Graças a Moro tudo mudou para o mesmo.
Texto de Juremir Machado da Silva, no seu blog no Correio do Povo.
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