A vida em Portugal está melhor do que no Brasil. Qualquer um percebe que há mais segurança e qualidade de vida. Portugal passou pela crise, quase sucumbiu ao seguir acriticamente os conselhos do neoliberalismo da União Europeia, corrigiu o rumo, resistiu, teimou e está em franca recuperação. Quantos brasileiros sonham em se mudar para Portugal? Quantos gostariam que o Brasil se transformasse num imenso Portugal? O curioso é que muitos querem as qualidades de Portugal sem ter de abandonar os defeitos do Brasil. Portugal é um país público. A mentalidade dominante enfatiza o senso comunitário. Paga-se muito imposto, tem-se ótimo retorno e não se quer abrir mão disso. A base da vida nos bons país europeus está na igualdade real.
O Brasil nunca será um excelente país para se viver enquanto mantiver os atuais níveis de desigualdade. Não vai funcionar. Podem combater a corrupção o quanto quiserem, criar prisões com milhões de vagas, aumentar indefinidamente o número de policiais, nada adiantará enquanto o fosso da desigualdade for oceânico. Portugal é um lugar sem grades. Quanto casa linda numa grande cidade como Porto sem grades nas janelas? O Brasil será um país gradeado enquanto bilionários pagarem proporcionalmente menos impostos do que assalariados. O problema do Brasil não é o policial que se aposentou com 40 anos de idade, como me disse um empresário, mas o fato de que o topo da sociedade vive no paraíso sem se dar conta de que se assenta sobre uma base desesperada.
A saúde, em Portugal, é quase totalmente pública para todo mundo. A direita resmunga. Mas sabe que está diante de uma conquista fundamental. Há coisas que só a educação produz. Por exemplo, o respeito ao pedestre na faixa de segurança. Em Portugal, como na maioria dos países europeus, chega a ser irritante. O motorista suspeita que a gente vai atravessar e já para. É uma humilhação para nós, brasileiros. Por que a nossa educação não funciona nesse sentido? Porque a educação só é realmente eficaz quando todos se sentem parte de alguma coisa. Num lugar onde poucos tem quase tudo e a maioria tem quase nada, sem perspectivas de mudança, o sentimento de respeito desaparece. No fundo, é cada um por si mesmo. Por que cooperar?
A desigualdade profunda desumaniza profundamente. Cada um vai se vendo como inimigo do outro. O cinismo predomina. A noção de solidariedade soa como uma piada de mau gosto. Valores só são introjetados quando cada um percebe correspondência nos outros. O Brasil não transmite qualquer ideia de compartilhamento. Não “tamu junto”. O exterior funciona como uma utopia pela qual não se quer pagar o preço necessário. O exemplo europeu socialdemocrata acaba por ser constrangedor. Qualidade de vida com igualdade parece uma relação indecente, coisa de comunista. Enquanto nos fechamos para almoçar, europeus podem comer em suas belas praças medievais. Aliás, comer ao livre é charmoso no Velho Mundo. Enquanto vivermos de desigualdade o Brasil não será um imenso Portugal. Será apenas um imenso inferno.
Texto de Juremir Machado da Silva, em seu blog.
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